ASSOCIAÇÃO BLC3 - CAMPUS DE TECNOLOGIA E INOVAÇÃO; COOPERATIVA AGRÍCOLA DE ALFÂNDEGA DA FÉ CRL; GREENCLON, LDA; INSTITUTO POLITÉCNICO DE COIMBRA
A integração de produtos florestais não-madeireiros no planeamento e gestão florestal tornou-se uma questão cada vez mais importante na silvicultura ao longo da última década. Dentro deste grupo de produtos encontram-se os cogumelos silvestres, que são valorizados devido ao às suas características gastronómicas, medicinais, comerciais, nutritivas e importância cultural. Alguns estudos indicam que a demanda do mercado por cogumelos continuará a crescer e, portanto, seu valor comercial pode exceder o valor da madeira (Kucuker & Baskent, 2014). A maioria das plantas terrestres estabelecem associações simbióticas com fungos micorrízicos. Estes fungos desempenham um papel muito importante nos ecossistemas terrestres, uma vez que regulam o ciclo de carbono e influenciam a estrutura do solo e a multifuncionalidade do ecossistema. Os fungos micorrízicos desenvolvem-se dentro do córtex da raiz, na superfície da raiz ou à volta das células epidérmicas da raiz. Estes fungos formam o micélio - conjunto de hifas que se desenvolvem em torno das raízes do hospedeiro e que permitem a troca de nutrientes entre a planta e o fungo. As raízes fornecem ao fungo água e compostos orgânicos (exemplo: hidratos de carbono), enquanto o fungo ajuda as raízes na absorção de azoto, fosforo comparativamente às plantas micorrizadas. O cogumelo é a frutificação (carpóforo ou corpo frutífero) de alguns fungos. Os cogumelos são produtos alimentares associados a um mercado de excelência internacional, que se encontra em franco crescimento, sendo normalmente reconhecido como um mercado de enorme valor acrescentado. Portugal e a sua floresta possuem as condições ideais para a produção biológica de cogumelos silvestres, uma vez que o território é influenciado por dois tipos de clima: o atlântico e o mediterrâneo. Há no entanto outros fatores, para além do clima, que aumentam a complexidade e diversidade da floresta portuguesa, como a natureza do solo, a proximidade do mar e a altitude, tudo em benefício de condições únicas para a proliferação e desenvolvimento de cogumelos de sabor intenso. A essência de frescura, sabor e autenticidade está agora materializada num conceito que pretende representar Portugal numa perspetiva de valorização e cooperação, pensada para posicionar o cogumelo silvestres nativos como chave para o desenvolvimento da economia local e nacional.
Assim tendo em conta a importância da interação planta-fungo para os ecossistemas florestais e para a produção de cogumelos silvestres, pretende-se com a presente iniciativa aplicar diferentes fitoestrogénios de forma a melhorar o processo da interação planta-fungo. Para tal proceder-se-á à micorrização de plantas nativas com diferentes fungos micorrízicos, tendo em atenção à aplicação de fitoestrogénios para a potencialização desta interação. A aplicação de fitoestrogénios na produção de plantas micorrizadas permitirá melhorar o estabelecimento da associação simbiótica e consequentemente a produção vegetal e a tolerância ao stresse, bem como a produção de cogumelos comestíveis. O novo método de micorrização será aplicado a espécies florestais nativas da região Mediterrânica, nomeadamente, Quercus suber, Quercus robur, Quercus ilex, Quercus pyrenaica, Pinus pinea, Pinus pinaster e Cistus sp.; e o inoculo utilizado será proveniente de espécies fúngicas nativas como Lactarius deliciosus, Boletus edulis, Boletus pinophilus Chantarellus cibarius, Hydnum repandum. Estas espécies fúngicas encontram-se entre as espécies silvestres mais colhidas e comercializadas em Portugal, e podem, juntamente com a biomassa florestal, representar um rendimento extra para os produtores florestais, contribuindo para o desenvolvimento das comunidades locais. A vantagem de os cogumelos serem reconhecidos como alimento funcional augura bom futuro para a crescimento contínuo e desenvolvimento da indústria de produção de cogumelos em todo o mundo. Assim, torna-se cada vez mais importante investir em novas soluções para este mercado em franco crescimento, apresentando soluções inovadoras para as espécies autóctones com alto valor ambiental de forma a tornar os sistemas de produção florestal sustentáveis em termos económicos para os proprietários.
A produção de cogumelos apresenta duas problemáticas principais:
i) a necessidade de novas respostas ao nível da otimização das taxas de micorrização e seleção de espécies de maior interesse económico;
ii) a falta de monitorização adequada da produção de plantas micorrizadas, que permita maior eficiência e maior qualidade do produto final.
Propõe-se nesta iniciativa a aplicação de fitoestrogénios que permitam a otimização da taxa de micorrização e a introdução de novas variedades nativas, que possam dar resposta à crescente procura do mercado nacional e internacional. A problemática identificada foi detetada pelo parceiro Voz da Natureza aquando do desenvolvimento do seu sistema de produção, tendo já identificado as principais linhas condutoras para a sua resolução conjuntamente com o consórcio da presente iniciativa.
A presente iniciativa visa valorizar os recursos florestais e micológicos otimizando o seu potencial ao nível de novas tecnologias da produção de cogumelos, através do recurso a um novo método de micorrização com a aplicação de fitoestrogénios. A iniciativa FitoMicorrizas tem como principal objetivo criar novas ferramentas que permitam aos produtores/proprietários florestais criar uma mais-valia de forma a tornar sustentáveis as áreas de espécies autóctones exploradas em longas rotações, criando um retorno económico a curto prazo através da produção de cogumelos comestíveis, potenciando e inovando as suas produções.
Como tal a presente iniciativa visa, mais especificamente:
- Otimização da produção e rendimentos de áreas florestais com espécies autóctones de alto valor ambiental, através de:
i) Desenvolvimento de tecnologias e processos para a produção de plantas micorrizadas (espécies autóctones) com recurso a fitoestrogénios e a fungos nativos;
ii) monitorização das plantas micorrizadas em viveiro e posteriormente no campo;
iii) adoção das melhores práticas para a produção de plantas micorrizadas e posterior instalação no campo;
iv) otimização diferentes tipos interação planta-fungo para a otimização da produção para diferentes variedades nativas de cogumelos silvestres;
v) descarbonização dos processos produtivos, pelo potencial de sequestro de carbono por parte dos macrofungos produzidos, otimizando o processo tornando-o mais sustentável.
- Desenvolvimento de novos produtos associados à atividade agroflorestal e economia verde:
i) introduzindo abordagens inovadoras nos processos ligados ao aproveitamento e transformação dos recursos endógenos naturais;
ii) otimizando a sua posição na cadeia de valor (e.g. gestão florestal sustentável, incluindo prevenção, deteção e combate a incêndios; gestão sustentável de matérias primas; agricultura e comercialização especializada de produtos agroalimentares).
Nesta iniciativa pretende-se, com o recurso a fitoestrogénios melhorar a interação entre o fungo e a planta, de forma a criar condições mais favoráveis ao estabelecimento da associação simbiótica entre os dois organismos. Tarefas:
1. Prospeção territorial de espécies micorrizicas nativas;
2. Colheita de sementes de espécies autóctones de diferentes regiões de proveniência;
3. Processamento da semente e germinação para produção de plantas;
4. Métodos de aplicação de fitoestrogénios para multiplicação de fungos micorrízicos;
5. Identificação e otimização de metodologias para estabelecimento da micorriza;
6. Avaliação da micorrização;
7. Instalação de ensaios de campo;
8. Promoção e divulgação da inicitaiva e dos respetivos resultados;
9. Gestão técnica da iniciativa.
Resultados finais e ações de divulgação. Consulte aqui (pdf)
A iniciativa FitoMicorrizas tem decorrido sem desvios significativos, sendo que as atividades inicialmente previstas até ao momento foram realizadas com sucesso. Nesta fase do projeto a maioria das atividades encontram-se a decorrer conforme esperado, apesar de algum trabalho ter sido adiado devido à pandemia COVID-19 que se vive atualmente.
Porém, como referenciado anteriormente, algumas tarefas já tinham sido encerradas com sucesso, como é o caso da atividade 1, na qual se realizaram prospeções a locais de interesse para colheita e identificação de cogumelos selvagens de interesse. Preparando um banco de inóculo vasto e representativo e um catálogo de cogumelos de interesse, contendo os seus locais de colheita e respetivo cruzamento com dados vários, culminando na elaboração de mapas SIG.
Também a atividade 2 já tinha sito terminada com sucesso, a qual envolveu a realização de saídas de campo para colheita de material vegetal, e reconhecimento de locais de interesse. Foi possível a colheita de sementes e rebentos de diversas espécies, e registo dos locais de interesse para inventário florestal.
A atividade 3 encontra-se sob a responsabilidade das diferentes entidades envolvidas, conforme as respetivas especializações e espécies alvo. Foram desenvolvidos protocolos otimizados quer para germinação ex vitro quer para estabelecimento in vitro, tendo-se estabelecido algumas plantas de interesse. Até ao momento, obtiveram-se muitas espécies germinadas em viveiro, e algumas isoladas e mantidas em condições asséticas. Algumas plantas de Quercus robur que tinham sido estabelecidas foram perdidas durante o estado de emergência que ocorreu de março a junho de 2020. Contudo, como foram realizados ensaios com plantas ex vitro não se refletiu grandes desvios aos trabalhos desta iniciativa.
A atividade 4 tem sido executada com sucesso, tendo-se atingido resultados promissores e delineado estratégias e metodologias inovadoras. Foram realizados vários ensaios de micorrização, usando plantas estabelecidas quer in vitro quer ex vitro, com diferentes espécies hospedeiras e também fúngicas. Foi possível o estabelecimento de relações simbióticas entre diferentes espécies, nomeadamente Arbutus unedo e Lactarius deliciosus e Cistus salviifolius e T. arenaria, o que revela o grau de inovação da presente iniciativa. Foram determinados os protocolos ótimos para crescimento de inóculo fúngico, com otimizações a nível de condições, meios de cultura, tipo de suporte (sólido, líquido ou inóculo vegetativo em substrato), homogeneização, e principalmente influência de fitoestrogénios. Foram realizados ensaios de crescimento de micélio, e determinada a concentração ótima quer de quercetina quer de genisteína. Desta forma, até ao momento iniciados diferentes processos de micorrização de espécies como o carvalho, pinheiro, medronheiro, castanheiro e várias cistáceas. Os resultados destes processos, permitiram estabelecer metodologias otimizadas para a implementação de um sistema de produção de plantas micorrizadas nas atividades subsequentes.
A atividade 5, ao encargo da entidade promotora, MicNatur, sendo desenvolvida juntamente com a ESAC; pretende a análise dos ensaios realizados na atividade anterior, de forma a selecionar quais as melhores metodologias de micorrização. Foi possível estabelecer relações simbióticas com sucesso, e analisar o respetivo efeito no fitness e qualidade da planta. Adicionalmente, foi possível verificar o efeito dos fitoestrogénios nos mesmos na taxa de sobrevivência da planta, no fitness e na taxa de micorrização. Resultados adicionais, foram obtidos posteriormente ao que refere à Tarefa 5.1 Identificação e seleção de metodologias de micorrização, o que possibilitou a criação de protocolos otimizados de micorrização das espécies hospedeiras de interesse neste projeto
.A Atividade 6 consiste na avaliação da micorrização das plantas geradas nas atividades 4 e 5. Esta tarefa foi iniciada, incluindo avaliação da persistência do fungo micorrízico, por avaliação da taxa de colonização nas raízes. As plantas foram mantidas em viveiro com sucesso, tendo-se o cuidado de controlar as condições e a adubação, de forma a aclimatizar as plantas micorrizadas para posterior passagem para o exterior. No que refere a esta tarefa foi avaliada a taxa de micorrização em plantas de Cistus salvifolius e Arbutus unedo. Por exemplo, plantas de C. salviifolius micorrizadas com T.arenaria apresentam taxas de colonização intercelular de cerca de 13 %, 6 meses após micorrização. Foram ainda visualizadas e analisadas as características morfológicas e anatómicas raízes de Pinus pinea e Quercus robur pelo que apesar de parecer haver sinais de micorrização uma confirmação a nível molecular deveria ser desenvolvida. No caso das plantas de medronheiro, e tendo em conta que muitas das metodologias já se encontravam definidas, tem-se avaliado a taxa de micorrização e fitness das plantas mantidas em viveiro frequentemente. Os resultados indicam taxas de micorrização na ordem de 20 % ou 8 %, dependendo do clone usado para o ensaio no caso da micorrização com L. deliciosus. No caso da micorrização com T. borchii, foram realizadas análises ao nível molecular para verificação da micorrização. Foi otimizado o protocolo de extração DNA de micorrizas de A. unedo, com vista, à obtenção de material genético de qualidade, para uso a jusante, em reações de qPCR. Adicionalmente, esta atividade pressupõe o controlo de qualidade das plantas produzidas, o qual tem sido realizado por avaliações regulares ao respetivo fitness (altura, largura caule, entre outros) e às estruturas radiculares.
A Atividade 7, foi iniciada, tendo sido já instaladas plantas micorrizadas de medronheiro em campo, e tendo sobrevivido com sucesso. Estas plantas estão a ser monitorizadas e avaliadas regularmente. Pretende-se continuar a colocar as restantes plantas em campo, incluindo as diferentes espécies vegetais micorrizadas com diferentes fungos, vindas de processos quer in vitro quer ex vitro, e mantidas na presença de quantidades ótimas de fitoestrogénio.
Em termos de divulgação de resultados, foi publicado um artigo em 2018 intitulado “Mycorrhizal synthesis between Tuber borchii and Arbutus unedo L. seedlings and micropropagated plants”, na revista Acta Horticulturae. Recentemente foi submetido a uma revista internacional um novo artigo sobre a influência dos fitoestrogénios na micorrização, intitulado “Effect of quercetin on mycorrhizal synthesis between Tuber borchii and Arbutus unedo L. in vitro plants”. Foram ainda realizadas 3 apresentação orais e 5 posters no âmbito da presente iniciativa.
Este GO foi apresentado no Agri-Innovation Summit 2017. O póster apresentado pode ser visto aqui.